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Madeira Report #14 by RubenVasconcelos
21 November 2013 Written by 

Madeira Report #14 by RubenVasconcelos

Esta semana chega-nos uma história interessante de um "geocacher" que sobreviveu na serra da estrela entre Fevereiro e Maio e esteve na Madeira recentemente.

 

Anthony Hopkins, quando jovem, conseguiu o papel principal em “A rapariga de Petrovka”, de George Feifer. Excitadíssimo, passou o dia seguinte à notícia em Londres, procurando uma cópia do livro, e embora tenha corrido dezenas de livrarias, a sua missão não teve sucesso. No regresso a casa, numa estação de metro, enquanto esperava, reparou num livro esquecido num banco. Quando lhe pegou, qual não foi o seu espanto quando descobriu que era, precisamente, aquele que procurava. Ainda assim, o pormenor mais formidável da história não é este. Dois anos depois, num jantar em Viena, Hopkins conheceu finalmente Feifer, que lhe explicou ter perdido, há uns anos, uma cópia de “A rapariga de Petrovka”, com anotações feitas em todas as páginas. Hopkins, num gesta mágico, retirou o livro encontrado um par de anos antes e apresentou-o a Feifer. Era o mesmo. O mundo tinha dado a volta sobre si várias vezes e o livro, no seu ritmo lento, encontrou o seu caminho até ao dono original. Tal como tinha sido deixado.

 No início de 2013, tive o meu momento “Anthony Hopkins” quando, numa expedição à serra da Estrela para subir a Garganta de Loriga, perdi o meu Garmin Dakota 20. Não será um drama enorme na escala universal do sofrimento humano, mas qualquer geocacher poderá identificar-se com a situação. O dia tinha sido esplêndido, na companhia de outros amigos geocachers e para quem conhece a Estrela, a Garganta de Loriga evoca logo memórias de paisagens soberbas. Subir desde Loriga até à Torre, ainda por cima com sol e encontrando neve e gelo pelo caminho, é não só uma experiência surreal, mas também o tipo de coisas pelas quais apetece dar um pontapé nos tintins à depressão. Culminar esta aventura com uma subida ao Cântaro Magro foi apenas ter mais um orgasmo múltiplo com um corpo fatigado deles. Mas o esplendor paga-se sempre caro, e no meu caso, o preço foi um Dakota 20. 

 

Garganta de Loriga

Chegado a casa, confrontado com a realidade do seu desaparecimento, dei voltas na minha mente: onde perdera o caraças do Dakota? Depois de um passeio em volta da minha mente, lembrei-me da possibilidade maior, uma cache chamada cobiça. Na página da mesma, deixei uma pequena note, alertando para um GPS perdido nas redondezas. Não foi com grande esperança que o fiz. A minha visão do mundo faz com que a de Kafka pareça um musical da Disney, e para mim as boas pessoas estão na mesma dimensão dos unicórnios ou dos políticos honestos: são mitos de que toda a gente já ouviu falar, mas nunca ninguém viu. Por isso, foi sem surpresa que não tive notícias de nada nos dias seguintes. A maior probabilidade, aliás, era a de que ninguém encontrasse sequer o Dakota, e a serra da Estrela viu neste 2013 um dos Invernos mais frios e nevosos dos tempos recentes. Na eventualidade de um milagre humano e do acaso, ainda que o aparelho surgisse no degelo, como uma Excalibur que se ergue nas mãos da Dama do Lago, estaria provavelmente arruinado e destruído. 


Deu-se isto nos inícios de Fevereiro. Em Maio, recebo um telefonema de um amigo geocacher, quer-me pedir um helpdesk, pensei; no entanto, era ele a oferecer-me ajuda: alguém tinha encontrado o meu GPS. De início, pensei que estava a gozar-me, mas quando me ofereceu o número de telemóvel do seu amigo, o rácio de brincadeira diminuiu. Era verdadinha: do outro lado da linha, encontrei o Nuno Vieira, dos Cudilos, que numa peregrinação à serra da Estrela, aos altares do bom geoaching, encontrara o famigerado Dakota. Encontrara o meu apelo na página da Cobiça, e mostrando-se muito pouco cobiçoso, ofereceu-se prontamente a fazer-me chegar o perdido filho pródigo. O pormenor mortal? O Dakota 20 funcionava na perfeição, ou quase, um Inverno serrano causara alguns problemas no ecrã táctil. Mas pormenores, perante a experiência. Posteriormente, encontrei-me com o simpático casal que compõe os Cudilos e pude ter nas mãos uma relíquia que em termos de milagre nada perde para o sudário de Turim. Mostrava algumas mossas, naturais do conflito bárbaro com o duro granito das paisagens lá de cima, mas sobrevivera, despertando, ao mesmo tempo, um respeito razoável pela boa vontade de pessoas que, não me conhecendo de lado algum, fizeram o que seria correcto, que eu teria feito.

 

Pelo meio, fiz a concessão de comprar um Dakota 10, porque tinha de visitar o arquipélago da Madeira, mas o seu irmão mais velho acabou mesmo por pisar a pérola do Atlântico pelas mãos de um outro militante procurador de plásticos, o senhor Hugo Dâmaso, que responde no mundo do geocaching por Bramble. Era o destino, à boa maneira de Hopkins e Feifer: foi graças ao dinheiro que ganhei a trabalhar na Madeira que pude comprar aquele Dakota 20. Nada mais adequado que a história fizesse o seu percurso circular com a sua visita a este arquipélago. Portanto, senhores da Garmin: em termos de resistência, este produto é bom, mas bom mesmo. Se quiserem colocá-lo num museu, contactem-me. Apenas tenham o cuidado de instalá-lo numa câmara frigorífico, é onde ele se conserva melhor.

 

É ou não é um sobrevivente? Quem poderá imaginar a alegria deste geocacher ao receber tal telefonema a dizer que o GPS que havia perdido em Fevereiro, tinha aparecido agora em Maio...e a funcionar. Depois de ter estado na serra da estrela 3 meses e coberto por neve, eis que renasce e volta para as mãos daquele que tanto o estimava.

 

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