A Aldeia...
Quando em fevereiro se proporcionou um passeio de fim de semana pelos distritos de Castelo Branco e Guarda, Sortelha era um dos destinos que tínhamos marcado para uma paragem e umas poucas horas de descoberta.
A chegada à aldeia é só por si bastante interessante e o coroar é mesmo a "Porta da vila", virada a Este e onde iremos entrar se chegarmos à pequena localidade da forma mais convencional (há outras portas sendo que a outra entrada principal dá pelo nome de "Porta Nova").
A entrada é deveras imponente e esconde de forma excepcional a beleza encerrada no interior...
"Sortelha mantém o seu legado medieval, o casario que se espraia como um regular anfiteatro de granito aninhado entre as muralhas, à sombra da silhueta altiva da torre de menagem, memória das estórias da primeira história de Portugal."
Uma singela frase que resume na perfeição a singularidade do espaço intra-muralhas...
Chegámos no que prometia ser o debaldar de uma verdadeira tempestade e procurámos refúgio logo ali, no interior do Restaurante Dom Sancho, no Largo do Corro e sob a protecção de uma lindíssimo e secular Lódão (árvore que pode chegar aos 600 anos de idade). Procurámos refúgio e alimento para o corpo... O alimento para a alma parecia que nos ia escapar pelos dedos. Os 760 metros de altitude não abonam muito a favor de passeatas com condições meteorológicas adversas...
Para nosso deleite, e enquanto nos debatíamos com pratos tradicionais muito bem confecionados, o sol levou de vencida as nefastas nuvens e quando voltamos a colocar os pés fora do conforto do restaurante parecia que tinha nascido um outro dia. Apesar de bastante... fresco vá, estavam reunidas condições mais que perfeitas para deambular pelas ruas desta "aldeia histórica de Portugal".
Ao subirmos pela "rua principal", que une as duas portas que refiro acima, passamos pelos locais (construções) mais interessantes, primeiro no Largo do Pelourinho manuelino, onde encontramos o dito e o acesso ao Castelo, além de alguns serviços e uns metros adiante o Largo da Igreja.
Deixámos a visita a ambos os espaços para mais tarde... Tínhamos agora todo o (bom) tempo para cirandar por ali e o meu GPS indicava que a cache que tinha pré-selecionado para procurar na região até estava no exterior das muralhas, para lá da porta oeste, falo da "Cabeça da Velha - Sortelha" [GC2BGVW] publicada em Julho de 2010 e da autoria do white_shark.
O interesse desta zona, fora da protecção da zona muralhada, não se perde neste penedo granítico deveras invulgar e podemos (devemos) dar alguma atenção às ruínas da Igreja da Misericórdia (ou de Santa Rita) e às suas Sepulturas Antropomórficas, não deixando do visitar o pequeno troço de bonita Calçada Medieval (um pouco além do antigo Hospital e da Capela de Santiago).
Aqui podemos encontrar, além das indicações da GR22 e dos painéis informativos (que populam por toda a urbe), um painel da PR6 – Rota dos Casteleiros (uma pequena rota linear com cerca de 6km e que faz a ligação de Sortelha a Casteleiro). Além deste, há um outro, o PR7 – Caminho Histórico de Sortelha, que se desenvolve em redor da localidade. Infelizmente e devido maioritariamente ao frio, não fizemos nenhuma destas, certamente muito interessantes, caminhadas.
Era tempo de regressar ao interior, desta vez utilizando a "Porta Falsa", aberta umas poucas dezenas de metros mais a Norte daquela por onde tínhamos saído. As ruas e ruelas são, de uma forma algo incomum, bastantes espaçosas. O relevo em forma de "anfiteatro" e o solo granítico terão contribuído de forma decisiva para que, ao invés de se proceder a adaptações no interior da aldeia, a população tenha procurado terrenos mais favoráveis e férteis no seu exterior, ajudando grandemente a que sejamos brindados hoje com o acesso a uma "das mais belas e antigas vilas portuguesas, tendo mantido a sua fisionomia urbana e arquitetónica inalterada até aos nossos dias, sendo considerada uma das mais bem conservadas."
Sortelha mantém de forma exemplar a traça medieval e devemos prestar alguma atenção também à parte habitacional. A grande maioria das casas são retangulares e de dois pisos, onde o piso superior está(va) reservado para habitação propriamente dita e o inferior ocupado pela "loja". As casas são invariavelmente muito simples, sem alpendre e com o mínimo necessário de portas e janela, pelo que se destacam algumas, propriedade de gentes com posição social de destaque (Casa do Escrivão, Casa do Governador e Casa do Juiz).
... e o Castelo!
O castelo de Sortelha não pode ser dissociado do conjunto histórico que forma com a restante aldeia histórica e por isso, excepcionalmente, temos um "dois em um"...
Local habitado desde a pré-história (pensa-se que tenha sido um Castro Neolítico), ergue-se sobre um maciço granítico dominante sobre o vale de Riba-Côa e foi ocupado por romanos, visigodos, muçulmanos e, a reboque da Reconquista Cristã da Península Ibérica, pelos Portugueses (provavelmente em 1187, no reinado de D. Sancho I).
O castelo na época medieval
O castelo propriamente dito terá sido construído em 1228 (foi o último dos castelos de estilo românico da Beira Interior a ser edificado), já com D. Sancho II (as muralhas terão sido erguidas apenas no reinado de D. Dinis, com a assinatura do Tratado de Alcanisese, e melhoradas por D. Fernando). As armas de D. Manuel I, colocadas na entrada, atestam as obras ordenadas pelo mesmo, por volta de 1500.
Da Guerra da Restauração aos nossos dias
A fortaleza voltou a ser alvo de intervenção por altura da Guerra da Restauração da Independência, para ser adaptada ao uso de artilharia. A localização estratégica do lugar colocou-o no caminho de muitas disputas, principalmente aquelas com Castela, mas os Franceses e as suas famosas Invasões (Guerra Peninsular) também por lá passaram.
Foi posteriormente desguarnecido e, tanto o castelo como a própria vila, votados ao abandono e decadência. Situação invertida com a classificação de Monumento Nacional (1910) e as obras de conservação e restauro subsequentes.
Características
O Castelo (ou cidadela) encontra-se 760 metros acima do nível do mar, e é de estilos românico e gótico, com alguns pormenores manuelinos. Está inserido na muralha da vila (a Sudeste da mesma) e cresce para o seu exterior. O acesso ao interior está localizado junto do pelourinho, por uma escadaria, e tem muros de "traçado ovalado irregular".
O Castelo em si tem duas portas, a "Porta do Castelo", a Nordeste, com ombreiras parcialmente entalhadas no afloramento rochoso, e a "Porta Falsa do Castelo", mais simples e localizada a Sul.
No interior da praça de armas está localizada a cisterna (quadrangular) e, no contro da zona mais elevada, a Torre de Menagem (também quadrada), de um só pavimento.
A cerca da vila (muralha) apresenta, tal como o castelo, um traçado ovalado irregular, ou seja, está construída sobre os afloramentos rochosos de granito e segue os seus contornos. Esta é rasgada por quatro portas, descritas no artigo dedicado à Aldeia.
O perímetro defensivo urbano integra ainda a Torre do Facho, a Nordeste, e, a Sudeste, junto à Porta da Vila, uma pequena torre (ou vigia), circular.
Um local a visitar (e revisitar), sem sombra de dúvida!
Fontes:
www.aldeiashistoricasdeportugal.com/sortelha
https://pt.wikipedia.org/wiki/Sortelha
www.sortelha.sabugal.pt
https://www.visitportugal.com/pt-pt/content/sortelha
https://pt.wikipedia.org/wiki/Castelo_de_Sortelha
http://www.historiadeportugal.info/castelo-de-sortelha/
Texto / Fotos: Rui Duarte (RuiJSDuarte)
Artigo publicado na GeoMagazine#22.
