Provavelmente, para muitos, eram horas de chegar a casa. Mas, para mim, era hora de sair.
Levantei-me cedo. Muito cedo. O sol ainda brilhava no outro lado do mundo. Corria um ventinho muito suave, nem frio nem quente. Apenas isso: suave. Saí de casa e fechei a porta devagarinho, para não acordar ninguém.
Estiquei os braços, estiquei o corpo e olhei para cima. O dia ia ser fantástico: as próximas horas seriam totalmente minhas, só minhas. Não podia perder nem um só minuto, para não ter de o procurar durante o resto do dia.
Há quanto tempo ansiava por este dia... já merecia!
Hoje era “o” dia. Nem a bicicleta a chiar ou as pernas enferrujadas seriam obstáculo para mim. O telemóvel tinha ficado em casa, desligado.
Era eu e só eu. E o GPS, claro. E apenas uma cache como objetivo do dia: Terreno de dificuldade 5 – a subir – para alcançá-la. Poderia ser uma missão arriscada ou impossível. Mas “eu faço o impossível, porque o possível já faz qualquer um”, diria Picasso.
Pelas 6h e pouco já estava a subir os trilhos em direção ao Cântaro mais Gordo do centro de Portugal, a bicicleta só atrapalhava. Encostei-a e segui caminho, rumo ao alto. A paisagem era de cortar a respiração. Brutal!
Lá em baixo o S da estrada, sem trânsito. Do outro lado o pequeno lago, a convidar a um mergulho se estivessem, pelo menos, 50º cá fora.
O silêncio reinava nestas montanhas. Que bom! Que paz! Ansiava chegar ao topo, ao GZ, à cache. E ficar por lá umas horas sentado, a saborear a paisagem, a contemplar o horizonte; simplesmente a respirar, a viver.
Entretanto, o astro rei começava a lançar os seus primeiros raios de luz para a serra. E eu quase no cimo.
Foi aí que reparei que não estava sozinho. Alguém estava sentado no topo a saborear a paisagem, a contemplar o horizonte, a viver.
Aproximei-me.
Vi a cache.
Ignorei a cache.
Sentei-me ao lado do senhor.
E fiquei.
Umas 2 horas depois ele falou por primeira e única vez:
“O homem não está feito para meditar, mas para atuar. Agora que te alimentaste, regressa lá baixo. Contempla quem está à tua volta, respira, atua e vive.”
Fiquei até chegar o calor do meio dia.
E desci.
De volta à vida. Cheio de energia e com a consciência que o importante não é chegar, mas ir.